História e histórias
A produção de energia elétrica começou no Paraná no
final do século XIX com a construção de centrais geradoras térmicas,
inicialmente a lenha e depois diesel e carvão. Posteriormente, quando havia
quedas d’água próximas, pequenas centrais hidrelétricas foram construídas,
normalmente nas proximidades das cidades, mas as térmicas predominaram por
muito tempo em sistemas isolados. Alguns exemplos:
Ano
|
Nome da
Usina (ou local)
|
MW
|
Local
|
Construção
|
Situação
|
||
1892
|
TL
|
(Praça Eufrásio Corrêa)
|
Curitiba
|
Cia Agua e
Luz de SP
|
Desativada
|
||
1901
|
TL
|
Capanema
|
Curitiba
|
Hauer
|
Desativada
com a construção de Chaminé
|
||
1902
|
TL
|
(Paranaguá)
|
Paranaguá
|
Família
Blitzkow
|
Desativada
|
||
1905
|
TL
|
(Ponta Grossa)
|
Ponta
Grossa
|
Guimarães
& Ericksen
|
Desativada
com a construção de Pitangui
|
||
1906
|
?
|
H
|
Rio Verde
|
Ponta
Grossa
|
Guimarães
& Ericksen
|
Desativada
com a construção de Pitangui
|
|
1910
|
H
|
Serra da Prata
|
Paranaguá
|
Desativada
na década de 1970
|
|||
1911
|
H
|
Pitangui
|
0,80
|
Ponta Grossa
|
Martins
& Carvalho
|
Operando
(concessão Copel)
|
H=Hidroelétrica, TL=Térmica a lenha
Aproveitamento de Sete Quedas, rio
Paraná
Em 1913 o
Presidente do Estado era Carlos Cavalcanti de Albuquerque. Em pleno conflito
nas questões de limites com o estado de Santa Catarina e em meio à chamada
“Guerra do Contestado” outra ameaça de invasão dos limites territoriais
paranaenses surgiu, mas na fronteira Oeste. O governo do Mato Grosso resolveu
de forma unilateral e sem aviso prévio arrendar terras da ilha de Sete Quedas
para aproveitamento do potencial hidráulico. Já havia um grande interessado, a
companhia ferroviária São Paulo/Rio Grande, que queria comprar a ilha e
arrendar a cachoeira. Coube ao Presidente Carlos Cavalcanti contestar a
iniciativa Mato-grossense, argüindo diretamente ao Presidente daquele estado
que, se ele ainda não sabia, a ilha era parte do território paranaense e a
questão logo foi resolvida.
A partir de 1930 começaram a aparecer as
hidrelétricas de médio porte, como a Usina Chaminé para abastecer a região de
Curitiba e Apucaraninha para Londrina. Estas duas centrais foram construídas
para operarem em 60 Hz e por muito tempo foram as únicas do estado com esta
freqüência, pois as demais usinas operavam em 50 Hz, que na época era a
freqüência sinalizada para padronização futura.
Ano
|
Nome da
Usina
|
MW
|
Local
|
Construção
|
Situação
|
||
1931
|
H
|
Chaminé
|
18
|
São José
dos Pinhais
|
CFLP
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1935
|
H
|
Sumidouro
|
0,48
|
Ponta
Grossa
|
Prada
|
Desativada
em 1972 (operou até 1949)
|
|
1945
|
H
|
São Jorge
|
2,3
|
Ponta
Grossa
|
Prada
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1949
|
H
|
Apucaraninha
|
9,5
|
Tamarana
|
EELSA
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1949
|
H
|
Rio dos Patos
|
1,8
|
Prudentópolis
|
FLISA
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1957
|
H
|
Guaricana
|
39
|
Guaratuba
|
CFLP
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1959
|
H
|
Salto do Vau
|
0,9
|
União da
Vitória
|
Alexandre
Schlemm
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1960
|
?
|
H
|
Ocoi
|
Foz Iguaçu
|
DAEE
|
Desativada
com a construção de Itaipu
|
|
1961
|
H
|
Marumbi
|
4,8
|
Morretes
|
RFFSA
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1961
|
H
|
Chopim I
|
1,8
|
Itapejara
do Oeste
|
DAEE/Copel
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1963
|
TC
|
Figueira
|
20
|
Figueira
|
UTELFA
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1964
|
H
|
Mourão I
|
8,2
|
Campo
Mourão
|
DAEE/Copel
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1965
|
H
|
Cavernoso
|
1,2
|
Virmond
|
DAEE
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1966
|
H
|
Melissa
|
1
|
Corbélia
|
DAEE
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1967
|
H
|
Salto Grande do Iguaçu
|
15,2
|
Copel
|
Desativada
com a construção de Foz Areia
|
||
1970
|
H
|
Júlio Mesquita Filho
|
44
|
Cruzeiro
do Iguaçú
|
Copel
|
Desativada
com a construção de Caxias
|
TC=Térmica a carvão
Aproveitamento do rio Iguaçú
Na capital a
preocupação era com a iluminação pública, considerada insuficiente e que
necessitava expressiva expansão. A concessão era da South Brazilian Railways que só produzia energia através de
usina térmica a lenha. Mas a South possuía também a concessão para
aproveitamento hidráulico da queda de Caiacanga, no rio Iguaçu, município de
Porto Amazonas, porém este projeto não foi adiante. Entre 1947 e 1950, no
governo de Moysés Lupion, deu-se início a obras de construção de várias usinas
(hidráulicas e térmicas), e dentre elas uma a fio d’água neste local, na margem
direita do rio, com previsão de 3000HP de capacidade, porem esta obra só foi
concluída em 1956, com uma usina piloto mais modesta, de 350HP. Hoje esta PCH
ainda opera como auto produção para uma indústria local. Portanto, a rigor,
este foi o primeiro aproveitamento hidrelétrico do rio Iguaçu e a usina Salto
Grande do Iguaçu, concluída em 1967 (15 MW) o primeiro aproveitamento
relevante.
Foi só a partir de 1970 que começaram a operar no
estado usinas hidrelétricas de maior porte, com a Usina Capivari-Cachoeira e
depois as da bacia do rio Iguaçu (Salto Osório, Santiago, Foz do Areia, Segredo
e Caxias).
Ano
|
Nome da
Usina
|
MW
|
Local
|
Construção
|
Situação
|
||
1971
|
H
|
Pedro V.Parigot de Souza (Capivari-Cachoeira)
|
260
|
Antonina
|
ELETROCAP
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1975
|
H
|
Salto Osório
|
1078
|
São Jorge
Oeste/Quedas Iguaçú
|
Copel/Eletrosul
|
Operando
(concessão Tractebel)
|
|
1980
|
H
|
Salto Santiago
|
1420
|
Saudade do
Iguaçú
|
Eletrosul
|
Operando
(concessão Tractebel)
|
|
1980
|
H
|
Bento Munhoz da Rocha Neto (Foz do Areia)
|
1676
|
Pinhão
|
Copel
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1992
|
H
|
Ney Aminthas de Barros Braga (Segredo)
|
1260
|
Mangueirinha
|
Copel
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1997
|
H
|
Derivação do Rio Jordão
|
6,5
|
Reserva do
Iguaçú
|
Copel
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1999
|
H
|
Governador José Richa (Caxias)
|
1240
|
Capitão
Leonidas Marques
|
Copel
|
Operando
(concessão Copel)
|
|
1999
|
E
|
Centrais Eólicas do Paraná
|
2,5
|
Palmas
|
C.E.Pr
|
Operando
(concessão Copel)
|
E=Eólica
Há ainda as usinas dos rios Paranapanema e Paraná
(Itaipu), fronteiras com São Paulo e Paraguai respectivamente de iniciativa
externa ao estado do Paraná.
Rio Paranapanema (PR/SP):
Ano
|
Nome da
Usina
|
MW
|
Local
|
Construção
|
Situação
|
||
1958
|
H
|
Lucas Nogueira Garcez (Salto Grande)
|
74
|
Cambará-Salto
Grande
|
USELPA
|
Operando
(Duke Energy)
|
|
1971
|
H
|
Xavantes
|
414
|
Ribeirão
Claro-Chavantes
|
USELPA
|
Operando
(Duke Energy)
|
|
1978
|
H
|
Capivara
|
619
|
Porecatu-Taciba
|
CESP
|
Operando
(Duke Energy)
|
|
1987
|
H
|
Rosana
|
353
|
Diamante
do Norte-Rosana
|
CESP
|
Operando
(Duke Energy)
|
|
1989
|
H
|
Taquaruçu
|
526
|
Itaguajé-Sandovalina
|
CESP
|
Operando
(Duke Energy)
|
|
1999
|
H
|
Canoas I
|
81
|
Duke
Energy
|
Operando
(Duke Energy)
|
||
1999
|
H
|
Canoas II
|
72
|
Andirá-Palmital
|
Duke
Energy
|
Operando
(Duke Energy)
|
Rio Paraná (Brasil/Paraguai):
1984
|
H
|
Itaipú
|
14000
|
Foz
Iguaçú-Cidade de Leste
|
Itaipú
|
Operando
(Itaipu)
|
Pequenas Notáveis
Notáveis e
Esquecidas PCH’s do Paraná
O estado do Paraná se notabilizou
pelos seus grandes aproveitamentos hidrelétricos dos rios Iguaçu, Paranapanema
e Paraná. Hoje ainda continuam a ser desenvolvidos projetos e construções de
hidrelétricas, agora de médio porte, em outros rios da região.
Também pequenas centrais
hidrelétricas (PCH’s) são aproveitadas, porem a importância delas está na soma
de seus potenciais, e não mais em sua condição individual.
Entretanto, nem sempre foi assim.
Houve época que as PCH’s eram a principal ou única fonte de fornecimento de
cidades e regiões circunvizinhas de aglomerados urbanos de variados tamanhos e
não eram então consideradas pequenas. Foram pioneiras na produção de energia em
larga escala com fins comerciais e objeto de desejo das comunidades em função
de que a alternativa eram usinas térmicas que dependiam de combustível (lenha,
carvão, diesel, etc), e conseqüentemente de toda uma logística correlata
(compra, transporte, armazenagem, etc) numa época em que as dificuldades eram
grandes e a infra-estrutura precária.
No Paraná elas
começaram a ser projetadas e construídas a pouco mais de 100 anos, e algumas
delas ainda se encontram em operação, porem a grande maioria foi desativada.
Dentre estas importantes usinas pioneiras há algumas com valor histórico de
maior destaque, seja por serem as primeiras a operarem no estado, seja pelo
motivo pelo qual o empreendimento foi concebido ou até por sua longevidade.
Por se tratar de
acontecimentos relativamente recentes pode parecer que esta história possa ser
contada com relativa facilidade, porem não é o que acontece, pois já é possível
observar que algumas caíram no esquecimento e às vezes levam a equívocos em
relatos desta cronologia.
Graças,
entretanto, a publicações literárias de reminiscências por parte de alguns
profissionais que atuaram no setor, é possível resgatar alguns relevantes fatos
deste período de pioneirismo da energia elétrica paranaense.
É o caso dos
livros “A Conquista da Serra do Mar” (1)
e "Os
Campos Gerais e sua Princesa" (2)
que entre outros assuntos regionais, abordam importantes relatos sobre as
usinas construídas na Serra do Mar e na região de Ponta Grossa,
respectivamente, no início do século XX.
Destaca-se entre elas as Usinas de
Serra da Prata, Cotia e Marumbi construídas em plena Serra do Mar e as Usinas
de Rio Verde e Pitangui na região de Ponta Grossa, não por suas capacidades de
produção, mas por aspectos históricos marcantes.
A usina Serra da Prata é citada
freqüentemente como sendo a primeira hidrelétrica do Paraná, tendo iniciado sua
operação em 1910 e estava localizada nas proximidades de Paranaguá. A usina de
Pitangui começou a operar em 1911 e é citada como sendo a segunda hidrelétrica
do estado. Entretanto, em "Os Campos Gerais e sua Princesa" o
autor esclarece que antes destas duas, a partir de 1906 teve início a
construção da Usina Rio Verde, perto de Ponta Grossa e manteve-se em operação
até a entrada em funcionamento da Usina Pitangui. Foi então desativada por
supostos problemas construtivos. Esta seria então a primeira usina hidrelétrica
do Paraná, seguida depois pela Serra da Prata (desativada na década de 1970) e
Pitangui (ainda em operação há mais de 100 anos).
Outra usina a operar por pouco
tempo e já pouco lembrada é a Usina de Cotia. Esta PCH funcionou por oito anos
apenas e foi desativada na década de 1960, com as obras de construção da Usina
Capivari-Cachoeira. Localizada próximo à estação geradora de Capivari, restou
apenas as ruínas da casa de força e de seu reservatório, este apelidado pelos
que se aventuram pela Serra do Mar de piscina de elefantes.
Mais uma “Pequena Notável” é a
Usina Marumbi, concluída em 1961. Ao contrário das demais citadas, esta usina
não foi concebida para atender a demanda de centros urbanos. Foi planejada e
construída com o propósito de fornecer energia elétrica para tração
ferroviária, pois se pretendia eletrificar a estrada de ferro
Paranaguá-Curitiba-Engenheiro Bley (3)
e utilizar locomotivas movidas à eletricidade ao longo deste percurso.
Por uma série de acontecimentos este propósito não foi plenamente
alcançado e a usina acabou sendo posteriormente (1997) adquirida pela Companhia
Paranaense de Energia (COPEL) e continua operado ainda hoje, interligada ao
sistema.
Estas singelas histórias da
história muitas vezes passam despercebidas, porem guardam aspectos relevantes
do passado que merecem ser periodicamente relembrado. Caberá aos historiadores
resgatarem os verdadeiros acontecimentos, pois só através de registros oficiais
será possível esclarecer certos fatos que não possuem mais testemunhos
pessoais.
_____
1-A Conquista da Serra do Mar - Rubens R. Habitzreuter - Editora Pinha - 2000.
2-Os Campos Gerais e sua Princesa - Francisco Lothar Paulo Lange - 1998.
3-A Estação Eng. Bley se situa entre Araucária e Porto Amazonas, na estrada de ferro Curitiba-Ponta Grossa.
Usina centenária
Ponta Grossa foi a terceira cidade paranaense a contar
com energia elétrica para iluminação pública e privada. Depois de Curitiba
(1892) e Paranaguá (1902), foi em 1905 (1)
que foi construída e passou a operar na cidade uma usina termo-elétrica a vapor
(lenha), construída pela empresa Guimarães & Ericksen, em corrente contínua
(230V). Pela sua localização geográfica estratégica, Ponta Grossa sempre esteve
entre as cidades mais importantes do estado, pois era ponto de convergência das
rotas terrestes percorrido pelos tropeiros que iam de norte a sul e leste a
oeste e posteriormente pelas estradas de ferro e rodagem. Especialmente após
ser inserida nas rotas das estradas de ferro, sua importância se fez ainda mais
relevante. Primeiro ao ser alcançada pelo prolongamento da estrada de ferro
Paranaguá/Curitiba, em 1894, em meio a revolução federalista (2) e depois como rota da estrada de ferro São
Paulo/Rio Grande em 1910.
Passou então a ter a primazia do pioneirismo estadual em
alguns eventos importantes, como por exemplo, a construção da primeira usina
hidrelétrica, no Rio Verde (construída pela mesma empresa que havia construído
a usina térmica). É considerado também o berço do futebol profissional
estadual. Charles Wrigth era engenheiro inglês funcionário da empresa construtora
da estrada de ferro São Paulo/Rio Grande e trouxe para Ponta Grossa os
apetrechos necessários para a prática do esporte.
Formou um time e começou a praticar e jogar partidas e
em 1909 convidou os curitibanos para adversários numa partida pioneira em fins
deste ano em Ponta Grossa. O desafio foi aceito e estes times mais tarde
geraram os clubes do Operário Ferroviário de Ponta Grossa e o Coritiba Futebol
Clube.
Pois é também em Ponta Grossa que opera a mais antiga
usina hidrelétrica ainda em atividade do Paraná, a Usina Pitangui, a apenas
12km da cidade. Construída no rio de mesmo nome em 1911, pela empresa Martins
& Carvalho, que desde 1909 havia assumido o serviço de eletricidade
municipal, foi inaugurada em 09/07/1911. Projetada inicialmente para três
unidades geradoras de 150kVA cada, começou a operar com apenas uma unidade,
sendo que as demais foram colocadas em funcionamento ao longo dos dois anos
seguintes.
Sua operação permitiu que as duas outras usinas
existentes na cidade fossem desativadas, especialmente a Usina Rio Verde que,
segundo consta, apresentou problemas técnicos de projeto. Hoje potências
instaladas desta ordem de grandeza (frações de MW) nos parecem muito pequeno,
pois mal conseguem atender a algumas dezenas de consumidores com o perfil de
carga atual, mas na época eram suficientes para as demandas inteiras de cidades
ou regiões, que se constituíam quase exclusivamente de iluminação. Isto na fase
pioneira, pois muito rapidamente o uso da eletricidade se tornou crescente e
não tardou para que a produção não conseguisse acompanhar o consumo e gerar
demanda reprimida.
2011 marcou, portanto, o centenário da Usina Pitangui e
nestes 100 anos de vida sua concessão foi assumida por outras empresas e passou
por várias outras transformações. Em 1923 o serviço de eletricidade de Ponta
Grossa mais uma vez mudou de mãos, passando então para a Cia Prada de
Eletricidade (3). Esta empresa
construiu uma barragem no rio em 1929 e assim pode aumentar a capacidade da
Usina Pitangui adicionando um gerador de 510kVA. Posteriormente, a altura da
barragem foi elevada, o que possibilitou a construção da Usina Sumidouro em
1935 com 480kW (3x160kW). Em 1945 uma terceira usina foi concluída neste mesmo
rio, Usina São Jorge (2,3MW). A partir daí a Usina Sumidouro passou a operar
apenas em situações de necessidade e foi posteriormente desativada. O lago formado pela barragem, chamado de Alagados, além
de gerar energia, abastece de água a cidade de Ponta Grossa.
Em 1973 a Prada foi vendida para a Companhia Paranaense
de Energia (Copel), que desde então vem mantendo a concessão das usinas do Rio
Pitangui (Pitangui e São Jorge). Alem de serem automatizadas recentemente,
estas usinas passaram por reformas diversas em épocas diferentes, adequando-as
as padronizações de freqüência e tensão, alem de eventuais substituições de
grupos geradores. Atualmente a Usina Pitangui segue gerando com quatro máquinas
e potência total de 800kW, em paralelo com o sistema elétrico nacional através
de uma linha de distribuição de 34,5kV.
A Usina Pitangui é uma rara sobrevivente entre dezenas
que operaram no estado durante a primeira metade do século XX e que hoje
consideramos pequenas hidrelétricas. Das que ainda se encontram em operação, a
mais antiga do Paraná, depois de Pitangui é a Usina Chaminé, em São José dos
Pinhais, inaugurada em 1931 pela Companhia Força e Luz do Paraná para abastecer
a cidade de Curitiba e região.
_____
1-A maior parte das informações sobre a história da energia elétrica em Ponta Grossa foram baseadas no livro “Os Campos Gerais e sua Princesa”, de Francisco Lothar Paulo Lange, edição de 1998.
2-Maragatos liderados por Gumercindo Saraiva (líder da revolução federalista), depois de ocupar Tijucas do Sul, Curitiba e a Lapa, rumaram para Ponta Grossa utilizando a recém construída estrada de ferro.
3-A “Prada” fazia parte das empresas do Comendador Agostinho Prada (1885-1975), empresário que atuava em vários ramos de atividade como fábrica de chapéu e telefonia. Alem de Ponta Grossa, foi concessionário de distribuição de energia elétrica em outras cidades, incluindo Uberlândia (desde 1929), que também em 1973 foi vendida (para a Cemig).
Usina São Jorge
Construída
durante o período da segunda guerra mundial, sofreu com a falta de materiais e
equipamentos que deveriam ser importados. O curioso é que uma parte da
tubulação adutora foi construída em madeira, devido à falta de chapas de aço, e
o seu primeiro grupo gerador de 1,4 MVA foi fabricado pela indústria nacional.
Quando a Copel assumiu o serviço, este grupo estava danificado e foi
substituído por outro que operava na Usina do Ocoí, que havia sido desativada
com a construção de Itaipu. A exemplo de Pitangui, ainda se encontra em operação.
Pequenas Notáveis –
Legado
Preservação
histórica das PCH’s
Depois das pioneiras pequenas
centrais hidrelétricas (PCH’s) construídas nos Campos Gerais e Serra do Mar,
outras mais foram construídas em outras regiões do Paraná. A partir da década de
1920 começaram a se instalar indústrias em cidades do norte pioneiro (como
Arapoti e Jaguariaiva), litoral (Antonina) e centro-sul (União da Vitória) como
indústrias de papel, alimentos e madeireiras. A única forma de estes
empreendimentos contar com energia elétrica era produção própria a partir de
geração diesel ou aproveitamento de capacidades de rios nas proximidades das fábricas ou ainda
ambos. Várias PCH’s foram construídas para auto-produção nas proximidades
destas indústrias e algumas vezes atendiam também as vilas residenciais no
entorno delas. As Indústrias Matarazzo e Indústrias Brasileiras de Papéis
possuíam PCH’s nestas regiões consideradas relevantes no contexto de produção
de energia elétrica na ocasião.
Outros locais mais distantes da capital
onde os municípios maiores ainda estavam muito isolados, como o centro-oeste e
oeste também adotaram a mesma receita em suas cidades e várias PCH’s foram
construídas, como em Palmas (salto Pinhal, 34kW), Prudentópolis (salto
Rieckler, 60HP), Irati (Caratuva, 2x150HP), Clevelândia (salto Claudelino,
50kW), Guarapuava (Jordão, 100kVA) e Foz do Iguaçu (Parque Nacional, 210kVA).
As regiões do norte novo e noroeste
só começaram a se desenvolver a partir da década de 1930 e Londrina (1) despontou como um novo grande centro
econômico paranaense. A primeira concessão foi assumida pela “Companhia de
Terras Norte do Paraná” (CTNP) em 1929 e em 1938 foi transferida para a
“Empresa Elétrica de Londrina-Mesquita & Davids”, de propriedade de Gastão de Mesquita Filho e Rolando da Fonseca Brabazon Davids. Em 1942 esta
empresa se transformou em sociedade anônima passando então a se chamar “Empresa
Elétrica de Londrina SA” (EELSA). Sua sede era em São Paulo (capital) e seu
diretor presidente o Sr. Rolando da Fonseca B. Davids(2). A encampação da EELSA pela Copel ocorreu
em 1974.
A EELSA atendia as cidades de
Londrina, Cambé (Nova Dantzig), Rolândia e outras no entorno e construiu três
hidrelétricas, sendo a primeira Cambézinho (no rio Cambé), a seguir Três Bocas
(no ribeirão Três Bocas), ambas em Londrina e finalmente Apucaraninha em
Tamarana (no rio de mesmo nome).
Usina Cambézinho
Turbina Principal: 360HP
Gerador: 270kW
Turbina Reserva: 110Hp
Gerador: 80kW
Funcionou de 1939 a 1967
Usina Três Bocas
Turbina: 800HP
Gerador: 500kW
Funcionou de 1943 a 1983
Usina Apucaraninha
A primeira concessão desta usina
foi outorgada em 1944 para “Stahlke Irmãos”, para uma fábrica de celulose,
pasta mecânica e compensados. Posteriormente (1946) a concessão foi transferida
para a EELSA e a usina foi inaugurada em 06/04/1949 com um grupo gerador de
2.750KVA. Em 1950 entrou em operação o segundo grupo de mesma potência do
primeiro e em 1953 foi adquirido o terceiro, de 6.000kVA. Na época a
transmissão da energia da usina até Londrina era feita através de uma linha de
44kV. Foram construídos dois reservatórios d’água, sendo o primeiro maior chamado
de Fiú e o segundo de Apucaraninha, a montante da usina. Um pouco mais adiante
o rio Apucaraninha deságua no rio Tibagi. Esta usina ainda se encontra
operando, interligada ao sistema elétrico da Copel, através de uma linha de
34,5kV entre a Usina e uma subestação em Londrina. Sua potência declarada hoje
é de 10.000kW.
É notável que estas três
hidrelétricas tenham sobrevivido, sendo que Apucaraninha se manteve em operação
com as modernizações necessárias e as outras duas, apesar de desativas foram
preservadas como patrimônios municipais abrigadas em dois parques de Londrina
criados ao redor de onde elas estavam localizadas: o “Parque Arthur Thomas” (3) dentro da cidade abriga a Usina Cambézinho
(também chamada de Usina Cambé) e o “Parque Ecológico Dr. Daisaku Ikeda” na
área rural do município, a Usina Três Bocas.
As casas de força de duas outras
PCH’s antigas foram preservadas e fazem parte do patrimônio histórico da Copel
(Museu da Energia). Uma delas é Caratuva (2x120kW), que se localizava próximo
de Irati e hoje está em exposição nas instalações da Copel em Curitiba (pólo do
km3). A outra é São Joaquim (150HP), que se localizava próximo a Jaguariaiva e
hoje está em exposição na Usina Foz do Areia. Entretanto, a melhor forma de
preservação é mantendo em funcionamento estes verdadeiros patrimônios
históricos e no Paraná várias PCHs antigas continuam em operação, a maioria
como parte integrante dos ativos da Copel.
Alem daquelas já citadas
anteriormente podemos acrescentar: Melissa (1.000kW) em Corbélia e Cavernoso
(1.300kW) em Virmond construídas pelo DAEE na década de 1960, Mourão (8.200kW)
em Campo Mourão e Chopim 1 (2.000kW) em Itapejara d’Oeste construídas pela
Copel também na década de 1960, Rio dos Patos (1.700kW) em Prudentópolis
operando desde 1949 e assumida pela Copel em 1978 com a encampação da FLISA (Força
e Luz de Irati SA) e Salto do Vau (900kW) em União da Vitória, operando desde
1959 e assumida pela Copel em 1973 com a encampação da empresa Empresa de
Eletricidade Alexandre Schlemm SA.
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1-Londrina surgiu em 1929, mas foi fundada oficialmente em 1934.
2-A subestação da região central de Londrina leva o nome de Rolando Davids.
3-Arthur Hugh Miller Thomas foi diretor gerente da CTNP, empresa inglesa que colonizou o norte novo do Paraná. Em 1944 a CTNP passou a ser chamada Companhia Melhoramentos Norte do Paraná.
Usinas afogadas
O início do aproveitamento do potencial hidrelétrico do rio Iguaçu
remonta da década de 1960 e numa primeira fase duas usinas de médio porte foram
construídas e mais tarde tiveram que ser desativadas para dar lugar a centrais
maiores, cujas águas represadas afogaram as instalações pioneiras. A Usina Salto
Grande do Iguaçu (15MW) foi a primeira a ser construída no rio Iguaçu. Ficava
no município de Bituruna e foi construída em 1967. A construção da Usina Foz do
Areia (1.676MW) no município de Pinhão (foz do rio Areia) ocasionou o
“afogamento” de Salto Grande pelo novo lago formado e conseqüentemente teve que
ser desativada em 1979. Foz do Areia começou a operar em 1980. Da mesma forma,
a Usina Júlio de Mesquita Filho (44MW) localizada na foz do rio Chopim, no
município de Cruzeiro do Iguaçu, construída em 1970 teve que ser desativada com
a construção da Usina Salto Caxias (1.240MW) no município de Capitão Leônidas
Marques. Caxias começou a operar em 1999.
Hidrelétricas da CFLP
Quando
a “Companhia Força e Luz do Paraná” (CFLP) assumiu a concessão de energia
elétrica de Curitiba em 1928 herdou o sistema elétrico da empresa antecessora (South)
e também o descontentamento generalizado dos consumidores pela má qualidade do
fornecimento. Até então a geração de energia elétrica para a cidade era térmica
a partir da queima de lenha e máquinas a vapor (1)
e a produção não conseguia mais acompanhar a demanda. A solução encontrada pela
CFLP foi aumentar a oferta através da construção de uma usina hidrelétrica na
Serra do Mar. Em menos de três anos foi construída a Usina Chaminé, em São José
dos Pinhais, inaugurada em 1931 e posteriormente ampliada e em 1957 entrou em
operação sua segunda hidrelétrica, Usina Guaricana, de novo na Serra do Mar no município
de Guaratuba e também ampliada mais tarde, até cada uma contar com quatro
grupos geradores. As obras de construção de ambas foi comandada pelo engenheiro
norte americano Howel Lewis Fry e estas
duas usinas ainda estão em operação e foram encampadas pela Copel em 1973,
junto com os demais ativos da CFLP.
Usina
Chaminé
Localizada
na Serra do Mar, município de São José dos Pinhais às margens do Rio São João e
próxima da Colônia Castelhanos.
Anterior
ao Código de Águas (1934), sua concessão foi outorgada pelo governo estadual.
Foi construída entre 1928 e 1931, composta de uma barragem no Salto do Meio
para represamento, casa de força com 308 metros de desnível em relação à tomada
d’água e conduto forçado de 2700 metros, dos quais 2000 metros de túnel
perfurados em rocha em vários trechos. Logo após o início das obras da casa de
força (1929), foi construído um sistema de trole (bondinho) sobre trilhos em
plano inclinado de 680 metros de extensão e 270 metros de desnível puxado por
cabo de aço ligando a Vila Residencial à casa de força e que até a algum tempo
atrás era o único meio de transporte de pessoas e equipamentos (hoje existe uma
estrada contornando o morro, até defronte a casa de força). Foi inaugurada em 15 de março de 1931 com uma potência de 8MW
(2x4MW). Alem da presença das autoridades locais como o interventor General
Mário Tourinho e o prefeito de Curitiba Coronel Joaquim Pereira de Macedo,
esteve presente na inauguração o Ministro do Trabalho Lindolfo Collor. Nesta época a Usina Térmica Capanema tinha
capacidade de aproximadamente 3MW e, portanto, a partir da operação de Chaminé
a térmica pôde ser desativada, passando então esta hidrelétrica a ser a única
fonte de geração da capital e assim permaneceu por muito tempo. Outro aspecto
relevante foi que esta foi a primeira usina do Paraná com freqüência de 60Hz,
que mais tarde seria padronizada no país. Até então predominava no estado a
freqüência de 50Hz e particularmente em Curitiba operava um alimentador de
2,3kV e a freqüência local era de 42Hz, que nesta ocasião foi substituído por
outro de 13,2kV (60Hz).
A transmissão da energia era através de uma linha de 55km,
66kV até a Subestação Bairro Capanema. Em 1946 a capacidade de Chaminé foi
ampliada para 12MW (3x4MW) e em 1954 para 16MW(4x4MW). Esta última etapa só foi
possível com a construção da represa de Vossoroca, somando a primeira (Salto do
Meio) maior volume de água. [hoje,
a capacidade declarada de Chaminé é 18MW]
Entretanto, para atender ao crescimento da demanda houve
necessidade de se adicionar à geração hidráulica uma série de geradores diesel
em Curitiba. Entre 1951 e 1954 a CFLP instalou no bairro Capanema nove
conjuntos de 1MW cada, totalizando 9MW. Era então necessário ampliar ainda mais
a geração hidráulica. Para tanto, a partir de 1952 a CFLP começou a preparar os
estudos de sua segunda hidrelétrica, a Usina de Guaricana.
Usina
Guaricana
Localizada
na Serra do Mar, município de Guaratuba na divisa com São José dos Pinhais e às
margens do Rio Arraial.
Obtida
a concessão federal em 1953, foi construída entre 1954 e 1957, composta de uma
barragem para represamento, casa de força com 300 metros de desnível em relação
à tomada d’água e conduto forçado com mais de 3km. Foi oficialmente inaugurada em 21 de setembro de 1957 com
uma potência de 15MW (2x7,5MW). A partir da operação de Guaricana a geração
diesel pode ser desativada (ao menos temporariamente, pois nesta mesma época
foi acrescido mais um gerador de 1MW no conjunto, totalizando 10MW de
capacidade). A transmissão da energia era através de uma linha de 59km, 66kV
até a Subestação Santa Quitéria. Em 1961 a usina foi ampliada para
22,5MW (3x7,5MW) e em 1971 para 39MW (+1x16,5MW). [hoje, a capacidade declarada de Guaricana é 36MW]
Na
primeira década do século XXI, Chaminé e Guaricana passaram por modernizações
importantes e foram automatizadas.
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1-Usina Térmica de Capanema (onde hoje se encontra a rodoferroviária de Curitiba).
2-Obra emergencial agravada por uma prolongada seca na região (1963). Contou com geradores capazes de fornecer 17,5MW.
3-A subestação Campo Comprido entrou em operação em 1965. Foi e ainda é uma subestação interligadora de sistemas, aonde chegam e saem linhas de transmissão de alta tensão, recebendo energia do sistema interligado e suprindo outras subestações de distribuição de Curitiba e região.
Mercado da CFLP
Alem de atuar na geração, transmissão e distribuição de energia elétrica
em Curitiba, a CFLP também operava os transportes urbanos da cidade (bondes e
ônibus) e no comércio (venda) de eletrodomésticos, como geladeiras, fogões,
ferros de passar roupa, ventiladores, etc. Portanto a limitação de capacidade
de fornecimento de energia elétrica seja por problemas de produção ou até mesmo
de queda de tensão na rede acarretava em prejuízos em seus negócios comerciais.
Interrupções
No relatório
referente a 1954, a CFLP reporta que houve durante todo o ano apenas sete
interrupções totais de energia, somando duração de 2horas e 10 minutos. Das
sete interrupções, cinco foram devido a descargas atmosféricas sobre a linha de
transmissão (Chaminé/Capanema).
Central do Cotia
Durante o mandato do Presidente Eurico Gaspar Dutra
(1946/1951) foi elaborado o Plano Salte (das primeiras letras de saúde,
alimentos, transporte e energia) e daí surgiu o Plano Nacional de
Eletrificação, com diretrizes para o setor, tais como:
-Sistema:
Divisão do país em regiões geográficas auto-suficientes, com centralização da
produção e conexões inter-regiões visando futura rede nacional de suprimento;
-Eletrificação
ferroviária: Direcionamento das conexões junto às linhas ferroviárias visando
eletrificação do transporte;
-Fontes:
Prioridade para os aproveitamentos hidroelétricos;
-Atuação
do Estado: centralizar o planejamento e fiscalização.
Partindo destas
diretrizes, em 1948
foi elaborado no Paraná pelo Departamento Estadual de Energia Elétrica (DAEE) o
Plano Hidroelétrico Paranaense “Moysés Lupion” (sic), estudo pioneiro de
planejamento ao nível de produção de energia elétrica para fins de consumo.
Moysés Lupion era então o governador do estado, eleito para o período de
12/03/1947 a 31/01/1951.
Dentre
as obras do Plano a mais importante era a construção de uma usina em Antonina
chamada Central do Cotia. Hoje pouco lembrado, este empreendimento foi
projetado para uma capacidade de 30.000HP (grande para a época). Previa captar
as águas dos afluentes do rio Cachoeira (Sacy, Cotia, Conceição, Rio do Meio,
São Sebastião e Jacu), represá-la e conduzir a um reservatório de compensação.
Do reservatório até a casa de força a queda era de 339,5m onde estavam
previstos quatro conjuntos de geradores de 7500kVA cada, acionados por turbinas
Pelton. A capacidade máxima da usina seria de 24000kW. Esta obra foi executada
nas décadas de 1940 e 1950.
A
transmissão da energia desta usina para as cidades do litoral paranaense foi
também prevista e seria composta de transformação 6,6/66kV em Cotia, linha de transmissão de 66kV em torres
metálicas com 30km até Morretes mais 36km de Morretes a Paranaguá e subestação
66/11kV em Morretes. Alimentador de distribuição de média tensão de 11kV de
Morretes a Antonina (14 km) compunha o restante do sistema.
Como as
demais usinas planejadas pelo DAEE até então, a freqüência definida foi de 50Hz
(1), o que era empecilho para a
interligação com Curitiba, pois, a Companhia Força e Luz do Paraná,
concessionária da capital havia adotado a freqüência de 60Hz (2). Pelo porte do empreendimento e pelo volume
do investimento na obra havia críticas sobre sua viabilidade, e a questão da
freqüência acabou engrossando ainda mais as desconfianças.
Trecho
de artigo de jornal da época:
“... Sabemos
que para o suprimento de Curitiba, em absoluto, não poderá servir, eis que a
corrente de Cotia será de 50 ciclos... Plantada no meio do mato, sem vizinhança
de nenhum outro grande centro consumidor capaz de justificar o vulto do
empreendimento e de compensar a sobrecarga de sacrifício que se está impondo ao
erário público, não atinamos para que afinal, está a referida usina sendo
construída...” (3).
Após a
troca de governo, em mensagem à Assembléia Legislativa (AL) em 01/05/1951, o
Governador Bento Munhoz da Rocha Neto então em início de mandato informa: “A
Usina Cotia está com seus serviços bem adiantados. Presentemente estão sendo
atacados os serviços de construção do edifício onde serão instalados quatro
grupos geradores de 7500kVA cada um, num total de 30.000kVA. O primeiro Grupo
de 7500KVA foi encomendado nos Estados Unidos, encontrando-se em Paranaguá o
material elétrico respectivo. Intercedemos por intermédio do Sr. Secretário de
Viação e Obras Públicas, junto à firma construtora no sentido de ser
providenciada com urgência a aquisição da tubulação forçada e das torres de
transmissão à subestação localizada em Morretes, para que, com a efetivação do
empréstimo do Banco do Brasil, que esperamos seja realizado, possam os serviços
prosseguir num ritmo mais intenso de produção, de maneira a se conseguir a
inauguração dos dois primeiros grupos dentro de 12 meses”.
Esta
previsão, entretanto, não se confirmou, pois o novo governo resolveu realizar
uma grande revisão nos projetos herdados da gestão anterior, mudando
prioridades e definindo novos rumos para o setor. No ano seguinte (1952) a
mensagem a AL dizia que não havia projeto para a obra, apenas anteprojeto e foi
com base neste que foram realizados os serviços até então. Estava em estudo a
viabilidade de continuidade da obra, não se descartando inclusive o seu abandono
e utilização dos materiais adquiridos em outros lugares. Finalmente, aventou-se
reduzir o projeto para uma usina-piloto que produzisse a energia necessária
para as obras de transposição do rio Capivari para a bacia do Cachoeira.
Posteriormente,
Moysés Lupion se elegeu novamente para o período de 31/01/1956 a 31/01/1961 e
em 01/05/1958 também em mensagem enviada a AL do Estado, o governador se refere
à previsão de entrada em operação desta usina “cuja primeira fase deve ser
inaugurada ainda este ano, produzindo 7500kW, numa contribuição vital para dar
solução ao angustiante problema do litoral”.
Na
mensagem de 1960, nova referência ao empreendimento é encontrada: “Enquanto
se aguarda o sistema Capivari-Cachoeira, obra de construção demorada, está
previsto, para desafogo imediato da região do litoral, a utilização da primeira
etapa da Usina do Cotia e da Usina do Marumbi”. Ou seja, entraram novos
atores em cena (Capivari e Marumbi, ainda hoje em operação), preparando a morte
anunciada de um empreendimento no mínimo equivocado. O desconforto dos
consumidores porem seria agravado ainda mais no início da década de 1960, com
racionamento de energia devido a uma forte estiagem, o que obrigou o estado a
instalar grandes geradores a óleo diesel na capital.
Restam
poucas notícias a respeito da duração da operação isolada da Usina Cotia, mas
sabe-se que foi logo colocada de lado e pouco tempo depois não se falava mais
dela. Localizada próximo à estação geradora da Usina Governador Parigot de
Souza (também conhecida como Capivari-Cachoeira), restou da Central do Cotia
apenas as ruínas da casa de força e do reservatório, este apelidado pelos que
hoje se aventuram pela Serra do Mar de “piscina de elefantes”. Elefante branco
parece mais apropriado.
_____
1-O governo federal havia decidido padronizar o Brasil em 50Hz, através do Decreto Lei 852/1938:
Art. 23: A energia elétrica, obtida por meio da transformação da energia hidráulica ou térmica será produzida, para ser fornecida no território brasileiro, sob forma de corrente alternativa trifásica com a freqüência de cinqüenta ciclos.
§ 1º As disposições deste artigo incidem desde já sobre as ampliações nas instalações existentes de produção das empresas, individuais ou coletivas, que forneçam energia para serviços públicos, ou de utilidade pública ou façam sob qualquer forma o comércio de energia.
§ 2º As disposições deste artigo incidem desde já sobre as ampliações das instalações de transmissão, transformação e distribuição para localidades ou zonas de uma mesma localidade ainda não servidas por energia elétrica.
§ 3º Dentro do prazo improrrogável de oito (8) anos e de acordo com o Regulamento que foi baixado, as empresas individuais ou coletivas que, sob forma diferente, forneçam energia elétrica para serviços públicos, de utilidade pública ou façam o comércio de energia, deverão ter todas as suas instalações funcionando de acordo com o estipulado neste artigo.
§ 4º O disposto neste artigo só admite exceções nos casos de usinas para uso exclusivo do autorizado ou concessionário e para indústrias especiais.
Posteriormente, o decreto 4295/1942 suspendeu o prazo e foi reticente quanto à padronização da freqüência: O prazo de que trata o art. 23, § 3º, do decreto-lei nº 852, de 11 de novembro de 1938, fica prorrogado por um período que será oportunamente fixado, e passa a ser permitido o emprego, em novas instalações e nas ampliações ou modificações das existentes, das correntes alternadas trifásicas de 50 e de 60 ciclos por segundo, distribuídas por zonas a serem delimitadas pelo C.N.A.E.E.
2-Em 1949, apenas duas usinas hidroelétricas paranaenses funcionavam em 60Hz (Apucaraninha, que atendia Londrina e Chaminé, Curitiba), o restante eram todas em 50Hz. Neste cenário apostou-se que a freqüência de 50Hz seria padronizada no Brasil, e o Plano manteve esta aposta em seus projetos, o que mais tarde não se verificou.
3-Ainda o “Caso” de Cotia, Artur Barthelmess, Diário da Tarde – 28/06/1950.
3-Ainda o “Caso” de Cotia, Artur Barthelmess, Diário da Tarde – 28/06/1950.
Do Capivari ao Cachoeira
No início do século XX já se fazia sentir a necessidade de produção de
energia elétrica em maior escala e com menores custos em função do mercado que
se formava, principalmente nos grandes centros urbanos, notadamente nas
capitais estaduais. As empresas estrangeiras aos poucos estavam dominando estes
mercados e trouxeram juntas suas experiências humanas e tecnológicas. As
melhores alternativas estavam no aproveitamento da hulha-branca, potencial
hidrelétrico de rios próximos, preferencialmente com elevadas quedas d’água.
Os rios que correm na Serra do Mar ou em sua vizinhança apresentam esta
característica. Do planalto ao litoral os desníveis podem chegar próximos a 1km
e isto não passou despercebido. Muitas usinas foram construídas nas regiões
serranas nesta época pioneira e logo na primeira década do século XX entrou em
operação a Usina de Lajes (1908), para suprir a então capital federal (Rio de
Janeiro), construída pela Light. Pouco depois (1926), esta mesma empresa
construiu uma outra importante hidrelétrica para o suprimento a São Paulo e o
litoral, em Cubatão. A idéia era simples, porem a execução nem tanto:
captava-se a água de rios serra acima, transportando-as através de canais
escavados em túneis e dutos até o litoral, onde se construíam as estações geradoras, despejando a água em outros rios que
corriam para o mar.
No Paraná, projetos de aproveitamentos de quedas d’água para suprimento a
Curitiba também datam desta mesma época. Em 1913 foi apresentado o primeiro
estudo de aproveitamento do potencial hidráulico do Rio Capivari, que corre a
partir do município vizinho de Curitiba, Bocaiúva do Sul, passando por Campina
Grande do Sul em direção a divisa dos estados de São Paulo com o Paraná (o
curso deste rio é paralelo à rodovia Régis Bitencourt – BR 116), desaguando no
Rio Pardo que é afluente do Rio Ribeira. Outros estudos deste mesmo rio foram
realizados na década de 1920, porém todos eles estavam voltados para o
aproveitamento da queda denominada “Salto do Inferno”, que fica próximo à
divisa PR/SP. A partir de 1910 a concessão de Curitiba foi assumida pela The
South Brazilian Railways Company Limited e a partir de 1928 passou para a Cia
Força e Luz do Paraná (CFLP), ambas de capital estrangeiro, mas que não
demonstraram interesse em implantar uma usina naquela região em função da
distância considerada então, muito longa (aproximadamente 85km) para o
transporte da energia. A CFLP optou pela construção da Usina Chaminé (concluída
em 1931), no Rio São João, dentro da Serra do Mar, que estava mais próximo de
Curitiba e acarretava em menores investimentos.
Entretanto, na década de 1940, após levantamentos de campo e medições de
vazão, a Divisão de Águas do Ministério da Agricultura sugeriu ao Governador
Manoel Ribas que o maior potencial se daria transpondo as águas do Rio Capivari
através da serra até o litoral, despejando-a no rio Cachoeira ou no rio Cacatú,
ambos situados no município de Antonina. Desta forma, o desnível entre a tomada
d’água e a casa de força seria de mais de 700m.
Partindo desta idéia, o Plano Hidroelétrico Paranaense “Moysés Lupion” elaborado pelo Departamento Estadual de Energia Elétrica (DAEE) em
1948 detalhou como se pretendia realizar o aproveitamento das bacias do
Capivari e Cachoeira, dividindo o potencial em quatro centrais, que ao todo
perfaziam 242.000HP:
1-Central do Conceição: Previa uma
represa no rio Capivari, despejo d’água num dos afluentes do rio Cachoeira,
construção de túnel de adução de 6,3km e tubulação forçada de 4km. O desnível
seria de 645m e a potência estimada era de 160.000HP;
2-Central Mourão: Construção de uma
barragem e reservatório no rio Cachoeira a montante do rio Cotia (garganta
Mourão). Potência estimada de 28.000HP;
3-Central do Cotia: Usina a fio
d’água, com captação dos afluentes do Rio Cachoeira (Sacy, Cotia, Conceição,
Rio do Meio, São Sebastião e Jacú) e construção de um reservatório de
regularização. Potência de 30.000HP;
4-Central do Cachoeira: Tomada das
águas das 3 usinas anteriores. Potência de 24.000HP.
Colocaram então este plano em
operação, começando pela construção da Central do Cotia.
Mudanças de governo definiram novos
rumos e a Central do Cotia não vingou. Em 1956 novos anteprojetos foram realizadas
por empresas de consultoria estrangeiras contratadas e em 1957 as concessões
das bacias foram transferidas para a Copel (1),
que havia sido criada em 1954. Selecionado o melhor anteprojeto, foi então
contratado o projeto para a construção da Usina Capivari-Cachoeira, transpondo
as águas do rio Capivari ao rio Cachoeira, com potência de início estimada em
150MW, que mudou para 230MW e finalmente para 250MW divididos em quatro
geradores de 62,5MW cada (2).
A previsão era de que a construção
demoraria sete anos. As obras preliminares começaram em 1961 e no ano seguinte
foi feito um convênio com o Departamento Nacional de Obras e Saneamento para a
construção da barragem da represa. Em 1963 foi constituída uma empresa
específica para a construção da hidrelétrica, a Central Elétrica
Capivari-Cachoeira S/A (Eletrocap), cujo capital era composto de 1/3 da
Eletrobrás e 2/3 da Copel(3).
O investimento foi bancado pelo
estado (através da Copel), pela união (através da Eletrobrás) e pelo BID (Banco
Interamericano de Desenvolvimento). Com a conclusão da obra a Eletrocap foi
encampada pela Copel.
O empreendimento conta com a
represa no Rio Capivari, canal adutor em túnel de 14 km escavado em rocha
atravessando a serra, condutor forçado com 1 km, casa de força subterrânea
(turbinas, geradores, sala de comando, etc), túnel de acesso de pessoas e
veículos à central geradora com 1,2km e canal de fuga (descarga) com 2,2km
quase todo subterrâneo. Estas características revelam, acima de tudo, a
complexidade da obra e a dificuldade de execução, motivo pelo qual levou quase
dez anos para sua conclusão.
A inauguração aconteceu em
26/01/1971 e em homenagem ao ex-presidente da Copel durante a fase de
construção, passou posteriormente a ser chamada Usina Governador Parigot de
Souza. Sua entrada em operação proporcionou a Curitiba e ao litoral do estado a
desejada auto-suficiência e possibilitou a desativação definitiva da geração
térmica a óleo diesel em Curitiba e Paranaguá, que haviam sido instaladas na
década de 1960 para evitar racionamentos recorrentes.
Atualmente, empreendimentos deste
tipo tornaram-se mais difíceis de implantação em função das exigências da
legislação ambiental. É fácil notar que os impactos ambientais de uma
transposição deste tipo não são pequenos, e ainda hoje se avaliam os danos ao
meio ambiente que decorreram destas obras, que foram realizadas sem muitos
cuidados desta natureza. Entretanto, foram iniciativas arrojadas que
acarretaram progressos significativos e bem estar expressivos para as
comunidades e regiões que delas se beneficiaram numa época de escassez de
energia elétrica e sistemas com poucas opções de intercâmbios.
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1-A concessão da Copel da Usina Capivari-Cachoeira foi renovada em 1995 e expira em 2015.
2-Hoje a capacidade declarada da usina é de 260MW, após repontencialização realizada em 1999.
3-Os 2/3 da Copel é aproximado, pois um pequeno percentual (menor que 1%) ficou de posse de várias outras entidades.
Inauguração de Chavantes e Capivari
A Usina de Chavantes está situada no rio Paranapanema,
na fronteira dos estados do Paraná e São Paulo, e possui capacidade de 414MW.
As obras de sua construção iniciaram em 1959. A conclusão das obras e início de
operação, tal como Capivari-Cachoeira datam de 1970. Entretanto, a inauguração oficial de ambas foi feita pelo
Presidente Emílio Garrastazu Médici com apenas um dia de intervalo. Médici
esteve na inauguração de Chavantes no dia 25/01/1971 e na de Capivari-Cachoeira
no dia seguinte.